quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Laura Assis

Laura Assis é uma poeta nascida em Juiz de Fora (MG) em 1985. É graduada em Letras e mestre em Estudos Literários pela UFJF. Atualmente cursa doutorado em Literatura na PUC-Rio. 
Tem poemas, contos, artigos e resenhas publicados em diversas revistas, jornais e sites. 
Em 2011 fundou a Aquela Editora, selo independente por meio do qual publicou os livros de estreia de poetas da cena de Juiz de Fora. 
Em 2013 ficou em primeiro lugar no V Prêmio Paulo Britto de Prosa & Poesia. Participou da Antologia de Poesia Plástico Bolha (Organograma, 2014), da exposição Poesia Agora (Museu da Língua Portuguesa, 2015) e da 1ª Bienal do Livro de Juiz de Fora (2016). Faz parte da equipe de organização do Eco Performances Poéticas. É autora de Depois de rasgar os mapas (Aquela Editora, 2014) e Todo poema é a história de uma perda (Edições Macondo, 2016).
Abaixo uma seleta com poemas seus já publicados e um inédito



Oberkampf

Nossos pais morreram
no mesmo acidente estúpido:
vimos o sangue,
vimos os corpos.
E você me fez prometer
que jamais
te deixaria

Morávamos
no mesmo
prédio,
no mesmo
andar.
Sua porta era colada
à minha porta e
entrar no seu quarto
ou no meu
era igual,
mas ao contrário.

O metrô passava a cada
três ou quatro
minutos
a estação era a cozinha
da sua casa,
parecia Oberkampf
mas com menos
azulejos amarelos.

Sua voz ainda era
uma força da natureza
que me alcançava
na sinestesia
dos sonhos.

E dos sonhos
acordei
e nunca mais
escrevi sobre cadernos
folhas
em branco
desertos
palavras escondidas
atrás de
palavras escondidas

E as coisas passaram
a ser como antes eram:
as coisas,
só as coisas

pouco importa a ênfase
pouco importa a verdade

o que importa é a vida
(e a vida
não cabe).

[de Depois de rasgar os mapas, 2014]


#


Dia

Ninguém sabe o que virá na trama estreita
da tarde que se abre livre sob teus passos,
mas neste espaço onde tudo muda,
e ainda assim nada acontece,
a comunicação é impossível
e isso é o que me faz querer tornar possível
o mundo que vejo em você.

Longe daqui eu seria outra pessoa,
acordaria cedo, falaria sobre o infinito,
desacreditaria de desastres e livros
ou escreveria poemas
sobre ter o coração no lugar certo.

Mas talvez explicando assim
você pare de me olhar
como quem não espera nada
além de um acidente:
antes das casas, casamentos e filhos,
depois das mortes, das visitas, dos confrontos
 a violência da sua presença
girando todos os dias
na órbita exata
das minhas escolhas.

[de Todo poema é a história de uma perda, 2016]


#


Ruína

Eu sei, éramos indelicados
com quem
acreditava na vida:
vinte anos e as paredes
impregnadas
de espanto
e desprezo
pela revolução.

Escuta, não sobrou nada,
anulamos todos os sinais,
nossa presença:
um ponto
sob o radar, e tudo
se perdeu por lá
com a certeza de um
incêndio.

Espero que agora
seus olhos
ofusquem
as luzes minerais
do Boulevard Saint-Michel.

Espero que você
esqueça
tudo aquilo que se desfez
na sombra clara do futuro
que não soubemos adivinhar.


[inédito]

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